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quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Tratados Internacionais para Evitar a Bitributação - Rendimento Assalariado

Neste segundo post sobre o tema de Tratados Internacionais, tratarei especificamente do dispositivo relativo à remuneração de profissional dependente - normalmente o artigo 15 dos tratados. 

Assim, tomarei como exemplo o disposto no tratado com a África do Sul para explicar este artigo. Reforço que pode haver divergência no teor do texto uma vez que este tratado é relativamente recente (Dec. 5922, de 03/10/2006) ao passo que vários tratados foram assinados e entraram em vigor entre as décadas de 70 e 80, o que acarreta alteração de linguagem e eventualmente algumas pessoas podem ter uma interpretação um pouco diferente em outros tratados.

Dispõe o artigo 15 do tratado com a África do Sul:

Artigo 15
Rendimentos de Emprego

1. Ressalvadas as disposições dos Artigos 16, 18 e 19, os salários, ordenados e outras remunerações similares percebidas por um residente de um Estado Contratante em razão de um emprego somente serão tributáveis nesse Estado, a não ser que o emprego seja exercido no outro Estado Contratante. Nesse caso, as remunerações correspondentes poderão ser tributadas nesse outro Estado.
2. Não obstante as disposições do parágrafo 1, as remunerações percebidas por um residente de um Estado Contratante em razão de um emprego exercido no outro Estado Contratante serão tributáveis somente no primeiro Estado mencionado se:
a) o beneficiário permanecer no outro Estado durante um período ou períodos que não excederem, no total, 183 dias em qualquer período de doze meses que começar ou terminar no ano fiscal em questão, E
b) as remunerações forem pagas por um empregador, ou em nome de um empregador, que não for residente do outro Estado, E
c) o encargo das remunerações não couber a um estabelecimento permanente ou a umas instalação fixa que o empregador mantiver no outro Estado.
3 Não obstante as disposições precedentes do presente Artigo, as remunerações percebidas em razão de um emprego exercido a bordo de um navio ou de uma aeronave operados no tráfego internacional por uma empresa de um Estado Contratante poderão ser tributadas nesse Estado.

Para apresentar meu entendimento sobre o artigo, vamos considerar que um brasileiro saiu do Brasil, apresentou declaração de saída definitiva do país e agora está trabalhando e sendo remunerado na África do Sul.

O parágrafo 1 é claro ao dizer que este brasileiro terá o seu rendimento tributado no país no qual reside, qual seja a África do Sul. Exceção a esta regra está no próprio parágrafo que autoriza a tributação de seu salário no Brasil caso esta pessoa seja residente na África do Sul mas exerça seu emprego no Brasil. Neste caso, por ser brasileiro e estar trabalhando aqui, entendo que ele volta a ser residente fiscal no país a partir do momento de seu retorno e portanto não há que se questionar o local da tributação do salário, uma vez que está exercendo seu trabalho aqui.

Já o parágrafo 2, nos dá uma outra situação, na qual, por exemplo, o brasileiro permanece residente fiscal no Brasil e exerce trabalho por um curto espaço de tempo na África do Sul. Neste caso, a tributação de seu salário permanecerá no Brasil, caso obedeça as 3 regras deste parágrafo, quais sejam: permanecer menos de 183 dias durante período de 12 meses na África do Sul, seu empregador está no Brasil e nem o encargo de sua remuneração é custeado por um estabelecimento permanente ou filial ou qualquer outra espécie de instalação que o empregador possua na África do Sul. Resumindo, o trabalhador não deixou de ser residente fiscal no Brasil - em razão do curto período no qual permanece no outro país e todos os custos de sua remuneração estão a cargo da empresa no Brasil. Se qualquer destes itens não for observado, entendo que o governo sul-africano tem o direito de tributar a remuneração deste brasileiro naquele país.

Há discussão na doutrina internacional sobre o que se considera rendimento, seja em razão da tradução dos tratados, seja em razão do que cada direito interno considera como rendimento tributável.

Sob o meu ponto de vista, o que deve ser observado no Brasil como rendimento percebido pelo empregado são todos os valores que entram em folha de pagamento e que são normalmente tributáveis para qualquer trabalhador local. Portanto salário, horas extras, 13° salário, férias, bônus, PLR e tudo o mais. Além disso, normalmente os expatriados recebem benefícios indiretos, os famosos fringe benefits como pagamento da escola dos filhos, aluguel, água, luz, telefone, tv a cabo e uma infinidade de outros benefícios que um empregado local não possui. Estes benefícios indiretos, ao meu ver, também devem entrar na folha de pagamentos da empresa no Brasil, se for custeada e paga por ela e, portanto, pode ser considerada sim como rendimento e entrará na análise deste artigo para se evitar a dupla tributação.

Com relação a pagamento de stock options (SO), normalmente aos diretores e alta gerência, como não há uma legislação interna determinando a natureza deste pagamento nem a tributação que lhe cabe é preciso que cada empresa analise seu plano de stock options (ou procure uma empresa que possua profissionais capacitados a realizar esta análise) para identificar a melhor forma de tributação das SO e também realizar a análise sob o ponto de vista dos tratados caso a empresa realize este pagamento através de ações localizadas no exterior. Lembrando que mesmo que o empregado seja residente fiscal no Brasil e receba estas ações no exterior e, ao vendê-las não traga o dinheiro para o Brasil esta venda é tributada aqui sim (e em alguns casos o simples recebimento da SO também é tributado) e é necessário identificar se o país de origem das ações ou do dinheiro recebido possui tratado com o Brasil para evitar a dupla tributação, se o país no qual estas ações se localizam realizará a tributação das ações e a melhor forma de se tributá-las no Brasil. Sugiro inclusive que, antes de oferecer tal pagamento ao empregado a empresa já saiba de todos os impactos fiscais para seu empregado ou diretor e o mais importante, deixe-o ciente de suas obrigações fiscais aqui no Brasil uma vez que a empresa pode ser considerada responsável solidária pelo recolhimento dos impostos das stock options.

Procurei dar sugestões gerais tomando como base um tratado, porém sei que o tema é baste complexo e divergente assim, caso tenham algum comentário, opiniões a acrescentar ou dúvidas, deixem nos comentários pois serão muito bem vindas!

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Tratados Internacionais para Evitar a Bitributação de Rendimentos de Pessoa Física


Este é o primeiro de alguns posts sobre este tema, interessante e longo para ser tratado de uma vez só.
O Brasil é signatário de diversos acordos e tratados, dos mais variados assuntos. Estes tratados normalmente são assinados pois garantem que o país continue sendo competitivo e atraente no mercado internacional.

Em se tratando de pessoas físicas, todos sabem que, se o ensino e a tecnologia brasileira forem comparados com o que existe no exterior a defasagem é notória. Enquanto engatinhamos em muitos setores no país: petróleo, energia limpa e renovável, ferramentas, equipamentos médicos, tecnologia da construção civil, automóveis menos poluentes e mais econômicos entre outros, a partir do momento que o empresário brasileiro toma coragem de encarar toda a burocracia interna para trazer um novo equipamento - já que não temos tecnologia ou incentivo para o desenvolvimento de novos produtos com qualidade e avanço tecnológico necessário - é preciso trazer também o estrangeiro expert no assunto para que trabalhe por um bom tempo por aqui ensinando os brasileiros a utilizarem o equipamento ou que seja simplesmente um técnico que possua as ferramentas certas para a montagem do equipamento e que seja capaz de treinar os utilizadores do produto.

Para que o empresário seja capaz de trazer o profissional estrangeiro sem onerar muito mais do que já é onerada a folha de pagamentos local e para que o convite seja considerado atrativo pelo estrangeiro que saberá que não vai deixar grande parte de seu salário no Brasil para pagamento de impostos, o Brasil é signatário de Tratados Internacionais para evitar a Dupla Tributação. 

Estes tratados não apresentam apenas as regras para a tributação de rendimentos recebidos por pessoas físicas residentes no Brasil, também ditam regras para rendimentos de empresas, porém este post fala apenas dos casos de rendimentos de cidadãos.

Todos os tratados são facilmente encontrados no site da Receita Federal do Brasil: http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/AcordosInternacionais/AcordosDuplaTrib.htm.

Atualmente estão em vigor tratados com os seguintes países: África do Sul, Argentina, Áustria, Bélgica, Canadá, Chile, China, Coreia, Dinamarca, Equador, Espanha, Filipinas, Finlândia, França, Hungria, Índia, Israel, Itália, Japão, Luxemburgo, México, Noruega, Países Baixos, Peru, Portugal, República Eslovaca, República Tcheca, Suécia, Turquia e Ucrânia.

Além dos tratados, o Governo, através da Receita Federal do Brasil, considera a reciprocidade de tratamento com Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha para permitir o crédito do imposto pago no exterior no momento da tributação deste rendimento aqui no Brasil (Ato Declaratório SRF nº 28, de 26 de abril de 2000; Ato Declaratório SRF nº 48, de 27 de junho de 2000; Ato Declaratório Interpretativo nº 16, de 22 de dezembro de 2005).

Para outros países que não possuam acordo ou com os quais a RFB não permita a reciprocidade de tratamento é possível tomar crédito do imposto pago naquele país desde que, quando o contribuinte for notificado para apresentar a comprovação da possibilidade do crédito, apresente cópia da lei publicada em órgão de imprensa oficial do país de origem do rendimento, traduzida por tradutor juramentado E autenticada pela repartição diplomática do Brasil naquele país OU mediante declaração deste órgão atestando a reciprocidade de tratamento tributário (IN SRF 208/02, art 1°, §2°). Bem simples, não? Então aqui a dica é: antes de trazer um estrangeiro para o país, verifique se o rendimento que é pago a ele vem de um país com o qual o Brasil possua acordo para evitar a dupla tributação ou pertença a um dos 3 reconhecidos por terem a reciprocidade de tratamento. Caso não seja, é melhor não trazê-lo ou se preparar para a grande dor de cabeça caso a pessoa utilize a compensação de imposto do exterior na declaração de IRPF e ela caia na malha fina.

Um ponto importante é analisar com critério o tratado e entender para quais tipos de rendimentos do exterior recebidos por pessoa física residente fiscal no Brasil podem ter o imposto estrangeiro compensado aqui. E, se o tratado permite a compensação faça-a sem medo pois o tratado é superior a qualquer legislação infraconstitucional (há discussões se o tratado por se superior à Constituição ou não, mas o que é certo é que é superior à legislação infraconstitucional). Isto significa que, caso a Receita Federal edite uma instrução normativa ou ato interpretativo desconsiderando a possibilidade do crédito do imposto alienígena para o caso de países com os quais somos signatários dos tratados para evitar a dupla tributação, sem sombra de dúvidas a RFB não poderá autuar o contribuinte pela compensação ou realizar a glosa do valor, alterando assim o resultado da declaração de IRPF. Caso o faça uma ação judicial é devida. A briga será boa uma vez que a Receita costuma recorrer até a última instância (STF) mas a razão está do lado do contribuinte.

Caso a empresa possua alguma dúvida sobre a possibilidade da utilização do tratado para os rendimentos recebidos por seus empregados ou mesmo uma pessoa física que seja residente do Brasil mas possua rendimentos no exterior e não sabe como declará-los, é de suma importância contatar um advogado tributarista, muito mais do que um contador, pois o advogado tem mais know how para interpretar a lei do que o contador. Sempre peça o número da lei o os artigos que tratam do tema, é importante manter esta informação principalmente no caso de algum questionamento por parte do Fisco.

Outro ponto importante para ser dito ainda neste post é com relação ao montante do imposto pago no exterior. Nossa legislação permite que seja compensado o imposto pago no exterior apenas até o limite do valor do imposto devido no Brasil. Portanto, se estamos falando de um rendimento que tem tributação de 27,5% no Brasil e 40% no exterior, não adianta se animar e pensar que a Receita brasileira vai devolver 12,5% (a diferença entre 40% e 27,5%). Não. Só é permitido o crédito até o limite de 27,5%. O que foi pago a mais no exterior não entrará como restituição aqui no Brasil.

Esta foi uma pequena introdução ao tema. Nas próximas semanas abordarei outros tópicos como tipos de rendimento e como fazer a compensação.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Informações Úteis sobre Resgate de FGTS para Residente no Brasil ou no Exterior

Todo trabalhador com registro na carteira de trabalho possui depósitos de FGTS vinculados ao seu PIS. Cada empresa na qual trabalhou "abre" uma conta na Caixa Econômica, porém o vínculo é com o número do seu PIS e com isso o trabalhador consegue enxergar o quanto possui no fundo de garantia relativo a todos os seus anos de trabalho.

É de conhecimento da maioria da população que podemos resgatar o FGTS para a aquisição de imóvel ou quando somos mandados embora da empresa. Porém, estes não são os únicos casos. Segue o rol das situações nas quais o saque do FGTS é permitido:

1. Demissão sem justa causa;

2. Término do contrato por prazo determinado;

3. Rescisão do contrato por extinção total ou parcial da empresa;

4. Rescisão do contrato por culpa recíproca ou força maior;

5. Aposentadoria;

6. Necessidade pessoal, urgente e grave decorrente de desastre natural causado por chuvas ou inundações que tenham atingido a área de residência do trabalhador, quando a situação de emergência ou o estado de calamidade pública for assim reconhecido, por meio de portaria do Governo Federal;

7. Suspensão do Trabalho Avulso;

8. Falecimento do trabalhador;

9. Idade igual ou superior a 70 anos;

10. Trabalhador ou seu dependente portador do vírus HIV;

11. Trabalhador ou seu dependente acometido de neoplasia maligna - câncer;

12. Trabalhador ou seu dependente em estágio terminal, em razão de doença grave;

13. Conta sem depósito por 3 (três) anos seguidos, cujo afastamento tenha ocorrido até 13/07/90;

14. Três anos seguidos fora do regime do FGTS, cujo afastamento tenha ocorrido a partir de 14/07/90, podendo o saque, neste caso, ser efetuado a partir do mês de aniversário do titular da conta;

15. Compra da casa própria, liquidação ou amortização de dívida ou pagamento de parte das prestações de financiamento habitacional.

A pergunta mais comum que recebo é como saber o saldo da conta do FGTS. A Caixa Econômica Federal envia um extrato a cada dois meses com a movimentação dos meses anteriores, referente a cada empresa na qual tenha trabalhado. Este extrato apresenta os valores depositados e os juros incidentes no período. Caso o trabalhador não receba a correspondência deve entrar em contato com a CEF, atualizar seu endereço e com isso começará a receber o extrato. Outra possibilidade é realizar a consulta diretamente no site do Banco, basta cadastrar a senha para a consulta ao fundo de garantia.

Fora as situações acima, não há a possibilidade de resgatar o dinheiro que está nesta conta e todos sabem o quanto é ridículo o rendimento deste fundo. Assim, recomendo que no momento em que ocorra qualquer das situações acima, faça o resgate do FGTS e, à exceção dos casos de resgate para utilização imediata do dinheiro, aplique este montante no fundo ou aplicação financeira que lhe parecer mais atrativa.

Para cada uma das situações que possibilitam o resgate é necessário apresentar uma lista de documentos, portanto verifique na CEF quais documentos precisa apresentar no seu caso específico para o resgate do FGTS. O site do banco é www.caixa.gov.br.

O trabalhador que atualmente mora no exterior e que teve contribuições ao FGTS durante o período de trabalho no Brasil também tem o direito de resgatar o fundo. 

A legislação não faz distinção entre brasileiros ou estrangeiros, portanto se o estrangeiro trabalhou por 2 ou 3 anos no Brasil com contrato de trabalho local, a empresa necessariamente deve ter realizado as contribuições ao FGTS. Este valor é por direito do empregado, não tendo a empresa o direito pedir que ele levante o montante e devolva para a empresa. Esta atitude pode ensejar ação trabalhista por parte do empregado e autuação dos fiscais do trabalho na empresa.

No caso do residente no exterior (brasileiro ou estrangeiro) ter pedido demissão da empresa no Brasil faz-se necessário que aguarde os 3 anos do item 14 acima para solicitar o resgate do FGTS. 

Uma boa notícia é que hoje em dia, dependendo do país no qual seja residente, ele não precisa retornar ao Brasil para solicitar o resgate do fundo. É possível fazer todo o trâmite via Consulado Brasileiro conveniado com a CEF. Nos seguintes países alguns consulados já realizam o serviço:
Alemanha, Argentina, Áustria, Bélgica, Bolívia, Espanha, EUA, França, Holanda, Irlanda, Itália, Japão, Paraguai, Portugal, Reino Unido, Suíça e Uruguai.
Todo o trâmite, documentos para download e endereço dos Consulados é obtido através do link da CEF: http://www.caixa.gov.br/fgts/pf_saque_exterior.asp#

Como este serviço para os residentes no exterior está se expandindo é importante consultar sempre o site da CEF pois este rol tende a aumentar.

Outro fato a se ressaltar no caso de residentes no exterior é que o resgate pode ser solicitado fora do país, porém a conta para depósito necessariamente, hoje em dia, precisa ser uma conta em banco no Brasil. Caso o trabalhador não possua mais nenhuma conta no país, poderá indicar a conta de alguém de sua confiança e a CEF realizará o depósito na conta deste indivíduo.